Entre-Rios: Relato de um processo pessoal de criação de poesia.

Neste breve texto, objetivamos relatar uma experiência de criação literária de poesia com base em leituras. O curso de um rio metaforizando o curso da vida é uma figura recorrente na literatura, mas me impressionou a maneira como o poeta estadunidense Langston Hughes (1902-1967), no poema “The Negro Speaks of Rivers” (1921) compara o curso do rio ao curso do sangue nas veias do corpo humano e traça a geografia do percurso dos negros escravizados do continente africano até as américas listando os rios do caminho.Conheci o poema durante a disciplina de Literatura Norte-Americana na graduação em Letras-Inglês e guardei uma imagem mental muito nítida. Alguns anos depois, quando fui lecionar a mesma disciplina em cursos de graduação em Letras, revisitei poemas para as aulas. Coincidentemente, naquele momento, começava uma carreira paralela como poeta e acabei sendo convidada a participar de uma antologia poética sobre o Rio Doce. Esse rio diz muito sobre a minha vida pessoal, visto que moro no Espírito Santo há muitos anos, mas minha família imediata reside em Minas Gerais, onde nasci. A família de meu pai, inclusive, vem da região do vale do Aço, onde passava férias e feriados com tios e primos. O curso do Rio Doce fala sobre a minha trajetória, assim como o poema de Hughes fala sobre o percurso dos povos negros escravizados da África às Américas. O poema de Hughes fala de um percurso histórico-geográfico de gerações de negros, mas a nitidez da metáfora era tão forte, que a tomei emprestada para o poema “O Rio sou Eu” de 2007. Assim, enquanto as lamentáveis circunstâncias históricas trouxeram os negros involuntariamente escravizados para o continente americano, circunstâncias econômicas trouxeram minha família para este estado quando eu era adolescente. Sou brasileira de cor branca no século 21, no entanto, ao entender que o poema deveria falar do Rio, o poema me veio imediatamente.Assim, os rios de Hughes correm no mesmo vermelho-sangue das veias do povo negro oprimido pela história. Meu Rio Doce, no entanto, tem a doçura do povo mineiro, na fala mansa, no tranquilidade das ações. O poema poderia ter falado da questão da mineração, da degradação do meio ambiente e de tantas outras questões, mas escolhi a via do meu amor pelos dois estados e pelo que há de mais belo e tranquilo nas culturas ligadas por esse rio.Portanto, deixo aqui meu poema “O Rio Sou Eu” e a tradução do poema “The Negro Speaks of Rivers”de Langston Hughes, convidando o leitor à essa navegação por épocas e circunstâncias tão diversas.

Expositor: Fernanda de Souza Hott Ribeiro

Minibio do expositor
Professora de Letras, Poeta, Cadeira 27 da Academia Feminina Espírito -Santense de Letras, Sub-Coordenadora do NAC – Campus Aracruz

Download: Relato de um processo de criação de poesia.atualizado

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